Ciclo de Palestras Ciência e Riqueza Social mostra como células a combustível podem gerar energia sem prejudicar o meio ambiente e até produzir substâncias de alto valor no mercado

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Transformar a energia do rompimento das ligações de uma molécula em energia elétrica suficiente para fazer funcionar um notebook – ou até um carro – pode parecer ficção científica. Mas, na realidade, esse tem sido o tema de pesquisas em universidades, entre elas, na própria USP São Carlos.

No dia 27 de agosto, o diretor e docente do Instituto de Química de São Carlos da USP, Germano Tremiliosi Filho, apresentou o assunto no primeiro evento do Ciclo de Palestras Ciência e Riqueza Social deste semestre. A pesquisa que ele desenvolve atualmente no Instituto envolve um dispositivo chamado célula a combustível.

Segundo o professor, esse dispositivo permite utilizar combustíveis que geralmente são utilizados para mover veículos, como o etanol e o hidrogênio, para provocar uma reação química e quebrar as ligações químicas de suas moléculas para produzir energia elétrica. Em alguns casos, é necessário o uso de um catalisador, uma substância que acelera a reação química. No caso do hidrogênio, a reação é espontânea, ocorre somente com o contato entre os gases hidrogênio e oxigênio.

“A grande vantagem da célula a combustível é que ela não é limitada por algumas leis da termodinâmica, entre elas o Ciclo de Carnot. Esse ciclo limita qualquer máquina térmica, onde ocorre uma reação de explosão, como num motor de um carro. Nessas máquinas há um aproveitamento máximo de 30% da energia na forma de energia. Já uma célula combustível gera um pouquinho de calor, mas pelo menos uns 90% de energia são aproveitados. Então é um sistema muito mais eficiente que um motor de carro”, explica ele.

Germano mostrou o funcionamento de três tipos de células a combustível: a de hidrogênio, a de etanol e a de glicerol. No caso das duas primeiras, há uma geração muito grande de energia, o suficiente para mover um carro ou fazer um notebook funcionar. O professor explicou que até um hospital pode ter um dispositivo desse tipo para funcionar como gerador em caso de falta de energia.

“Então todo hospital hoje usa um banco de baterias para fornecer energia quando acaba a força. Uma célula a combustível é uma proposta mais interessante porque as baterias são extremamente pesadas, essas células são muito mais leves. Além disso, um combustível como a gasolina, por exemplo, gera um monte de poluentes. Aqui não, aqui só forma água, um composto muito importante para nossa vida. E não vamos poluir o ar”, diz ele.

De acordo com o docente, as células a combustível de hidrogênio ainda não são usadas em larga escala porque o preço do gás não é competitivo com a gasolina. “O preço da gasolina cada dia está chegando mais próximo ao do hidrogênio, até que vai chegar o dia em que ambos tenham preços similares. Daí poderemos usar uma célula a combustível num carro elétrico. Essa diferença tá caindo. Infelizmente, agora o preço do barril de petróleo caiu muito, de 100 para 50 dólares, então a diferença ainda não é competitiva”.

Germano falou ainda sobre a célula a combustível de glicerol, popularmente conhecido como glicerina, um co-produto da reação que gera o biodiesel e que é utilizado na indústria de tabaco, de filmes de celulose, de alimentos e bebidas, de cosméticos e medicamentos.

“O Brasil já não tem mais onde colocar esse glicerol. Antigamente, ele vendia para a China, que era o grande consumidor. Hoje, não tá nem mais conseguindo vender pra China, porque tem muitos países fazendo biodiesel, então tem uma quantidade muito grande de biodiesel disponível no mercado. Ninguém está querendo comprar e aqui no Brasil ninguém sabe o que fazer com esse glicerol. Por isso fizemos uma proposta de desenvolver uma célula a combustível a glicerol”, contou ele.

O professor explicou que, diferentemente das demais células a combustível, essa não produz uma quantidade de energia considerável, mas pode ser usada como uma espécie de reator e produzir substâncias de alto valor agregado a partir do glicerol, como o ácido tartrônico, que tem importantes aplicações industriais, e a di-hidroxiacetona, utilizada na produção de protetores solares.

“Para vocês terem uma ideia, hoje a di-hidroxiacetona custa 150 dólares o quilo. Já o ácido tartrônico custa 1564 dólares o grama. Em compensação, o preço do glicerol no mercado internacional é de 0,25 dólares o litro. Hoje eu trabalho para que essa reação consiga formar uma quantidade muito grande de ácido tartrônico. Se a gente conseguir fazer seletivamente esse ácido a partir do glicerol, olha o lucro que o País vai ter!”